Da Natureza eres
07/06/2012
Primeira peza do poemario Sementeira do vento 1968. Recitado por Xosé Barato acompañado pola Real Filharmonía de Galicia no Concerto das Letras 2012
O prefacio do poemario foi encagado ao amigo e poeta brasileiro Guilherme de Almeida.
Valentín, meu poeta:
A ordem que você me dá de prefaciar a sua esplêndida Sementeira do vento é a única que não me deveria dar você, e á qual não poderia eu obedecer. Porquê a sua poesia é sanque: nosso sangue, um mesmo sangue, da matricial Galiza aos filiais Portugal e Brasil ritmadamente fluido. Sinto-a em min, palpitante, mas intangível, assim como ao infante seria impossível tomar ele o mesmo o pulso ao seu próprio cordão umbilical.
Foi daquele seu Vigo de 1933 -donde vi você trovar e vi Colmeiro lavrar- que me veio a veia alimentícia desse sangue; assim como daquele reino onde teve a sua corte Dom Denis. Rei Trovador e Rei Lavrador. E, pois, terra de trovas e lavras, é a Galiza, assim, uma autenticidade histórica:esse “matriarcado, arquivo de essência de uma raça” que marca, fundo, da primeira á última página, todo este seu lúcido livro, Valentín: esse livro que é seu e meu também. Deixe-me...
...deixe-me que lhe conte, amigo. Faz trinta e quatro anos que, estando eu em Santiago de Compostela, visitando a Catedral, aí descobri, na Capela do Santíssimo, creio eu, um vitral ofertado por uma dama cujo nome de família era “Andrade”. Ora, eu tambén sou Andrade, do lado materno: descendente de um daqueles cavaleiros que se passaram a Espanha, á guerra dos Mouros, com o Conde Dom Mendo, e foi seu solar a vila de Andrade, no Reino da Galiza.
Somos irmãos, Paz-Andrade. Sou, portanto, suspeito para dizer desta sua forte, livre, lúcida, sadia, pura, bela poesia, na qual escuto, com você, os “querendosos chamamentos do lar”, beijo a paterna mão do lavrador cujos dedos “abren como cinco chaves as entrañas da terra dende Adán”, escuto também o plim-plim das “voces unisílabas da pedra”; acompanho, na fimbria marítima “a fenda que vai no ceo abrindo o coitelo de lona dos veleiros”; saudei os “Benchegados ao porto, mariñeiros, a cabalo das ondas”, sob o tutelar tatalar do “verde vento polas leiras e vento azul polo mar, panos da nosa bandeira”...
Valentín Paz-Andrade: -Aqui tem você, nesta carta, o meu conmovido “ex voto” pela graça que recebo de sua milagrosa Poesia.
Guilherme de Almeida
São Paulo, 20 de outubro de 1967